sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

A retórica do motorista

Por Ítalo Chesley

Voltando ao trabalho depois de um horário de almoço um pouco conturbado – sim, depois que a gente fica morando sem os pais isso acontece – peguei um ônibus que sempre pego para voltar ao trabalho. O ônibus não estava cheio demais, nem vazio. Quando a porta se abriu, o motorista estendeu a mão aberta em minha direção, não disse nada, mas eu entendi que era para esperar. Depois ele ergueu a mão duas vezes com a palma para cima, ordenando que eu subisse: ele parecia atento.

Subi os dois degraus do ônibus, coloquei a mochila para frente, para não ter dificuldades com a roleta: a trocadora, esperava a minha ação; Um cara que desceria pela frente porque não passava na roleta; Uma menina que, à primeira vista, julguei bonita me olhou: provavelmente como olhava para todo mundo que subia no ônibus.

O motorista colocou o ônibus em movimento, paramos em uns 4 pontos: embarques, desembarques, trânsito, sol escaldante, calor, sono(muito sono).Já pela metade do caminho, em um cruzamento, pelo corredor deu pra ver passarem dois rapazes numa moto, um deles ergueu o braço e esboçou uma expressão meio feia, como quem estava coberto de razão: e ele estava, todavia, o motorista continuou dirigindo, alheio a tudo.

Uma mulher alta, com uma tatuagem na nuca de alguma dessas palavras japonesas que ninguém entende mas acha bonitas porque acreditam dizer coisas bonitas, uma roupa branca e um semblante fechado que estava sentada ao meu lado deu o sinal, o motorista, mais uma vez alheio não parou e ela gritou: “Ow!”. Uns 20 metros depois do ponto ele parou e ela desceu esbravejando com a respiração.

Desde então, passei a acompanhar os olhos do motorista e lembrar de quantas vezes eu também fiz besteiras com meus olhos, como os dele, esboçando que meu pensamento estava muito longe daqui.Quem poderia imaginar o que estava passando pela família dele? Pela cabeça dele? Pelo intestino dele? Ele poderia estar com dor de barriga ou com a conta no banco no vermelho e não sabia o que fazer.

Quantas outras coisas não poderiam aflingir aquele homem?

Quantas coisas não nos poderiam aflingir(e isso acontecerá) durante toda a nossa vida?

O jeito é tentar entender, tentar melhorar.

Quanto ao que aconteceu como motorista hoje, não sei, só sei que foi assim.



Para ler mais crônicas do autor, acesse http://italochesley.wordpress.com/

Sola Scriptura

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